Uma pergunta que quase sempre fica sem resposta: “Você gostaria de saber
que tem uma doença degenerativa e incurável, que só se manifestará
daqui a 10 anos?”. Nem os cientistas que pesquisam o tratamento do
Alzheimer têm opinião fechada. Enquanto alguns acham que ainda é cedo
para surpreender os pacientes com esse diagnóstico, outros apostam na
identificação do problema em pessoas mais velhas que começam a
apresentar os primeiros sinais. A justificativa é que, com tempo hábil, é
possível fazer intervenções para amenizar e mesmo retardar os sintomas
associados a esse mal.
Embora o Alzheimer não tenha sido
decifrado por completo, nos últimos cinco anos as pesquisas avançaram
significativamente. Hoje, já é certo o papel de duas proteínas na
degeneração do cérebro: a tau e a beta-amiloide. No primeiro caso, o que
mata as células são emaranhados de fios que se formam dentro do órgão
devido a alterações na estrutura da tau. Quando saudável, a proteína,
semelhante a trilhos de trem, organiza o transporte celular cerebral.
Mas, por motivos desconhecidos, ela começa a se embolar, o que destrói
os neurônios. Já a beta-amiloide é uma substância normalmente descartada
pelo líquido cefalorraquidiano, que circula do cérebro para a coluna
espinhal. Contudo, um distúrbio também ainda sob investigação faz com
que ela se acumule, formando placas tóxicas e nocivas.
Os
cientistas lutam para entender o que desencadeia os dois processos. Há
algumas pistas e sabe-se que fatores hereditários, problemas vasculares e
obesidade favorecem o surgimento do mal. Mas, mesmo sem conhecer a raiz
do Alzheimer, o avanço das pesquisas permite, hoje, identificar essas
alterações pré-clínicas, que surgem muito antes de os sintomas mais
consistentes aparecerem. Além de técnicas de imagem, exames de sangue e
oftalmológicos, que indicam a presença de biomarcadores, testes
cognitivos cada vez mais aprimorados são capazes de diagnosticar a
doença. Essas ferramentas ainda estão sob estudo e só se aplicam no
universo restrito das pesquisas científicas. A expectativa, porém, é de
que boa parte delas esteja disponível em breve nos consultórios.
“O
diagnóstico preciso e precoce é benéfico por diversas razões”, diz Guy
M. McKhann, neurocientista da Faculdade de Medicina da Universidade
Johns Hopkins e um dos autores das diretrizes adotadas pelos médicos
americanos para a detecção da doença. “Existe tratamento para os
sintomas, como depressão, ansiedade e perda de memória. Começar esse
tratamento cedo pode ajudar a preservar as funções mentais e cerebrais
por algum tempo, embora o processo por trás da doença ainda não possa
ser alterado”, afirma.
McKhann enumera outros motivos: ajudar o
paciente e a família a planejar o futuro, tomar decisões financeiras,
legais e materiais e desenvolver uma rede de apoio. “Há uma outra razão
bem prática também. O diagnóstico precoce pode fornecer uma grande
oportunidade para as pessoas com a doença se envolverem em estudos
científicos, nos quais testamos a segurança e a efetividade de uma
medicação ou de outra intervenção.”
Exames
Atualmente,
os médicos dão o parecer sobre a doença a partir de exames clínicos,
que avaliam mudança de comportamento e alterações cognitivas para
encaixar o paciente em uma dessas duas categorias: deficiência cognitiva
moderada devido à doença de Alzheimer ou demência. No primeiro caso,
estão presentes as mudanças na memória e nas capacidades de pensamento
já perceptíveis e mensuráveis. Porém, a atividade cotidiana ainda não
foi totalmente comprometida. Na demência, contudo, o paciente exibe os
sinais clássicos do Alzheimer, como não reconhecer mais as pessoas e
perder a habilidade de executar tarefas simples, uma delas é se
alimentar.Os
testes que estão sendo pesquisados visam detectar a doença em uma fase
que, hoje, ainda não é contemplada pelas diretrizes disponíveis.
Trata-se do Alzheimer pré-clínico, quando o mal não se manifesta por
sinais claros. Nesse momento, porém, já é possível visualizar os
emaranhados da proteína tau ou detectar, no sangue ou em amostras do
líquido cefalorraquidiano, quantidades anormais da beta-amiloide. Esses
métodos já vêm sendo utilizados nos estudos científicos, mas os
pesquisadores também querem encontrar meios não invasivos, simples e
seguros para, em um exame de rotina, notarem sinais precoces do
Alzheimer. Enquanto o PET scan ainda é um método caro e indisponível em
muitos lugares, a análise do líquido se dá pela punção lombar, quando
uma agulha é inserida entre duas vértebras.
“Essa doença é uma
epidemia crescente e, em face disso, há uma pressão muito grande para
testes simplificados que identifiquem os riscos muito antes que o
processo da doença siga seu curso”, afirma Heather Snyder, diretora de
operações médicas e científicas da Associação de Alzheimer. “Isso é
especialmente verdadeiro à medida que os pesquisadores se concentram em
novos tratamentos que consigam retardar o progresso da doença”, opina.
Células
Um
dos métodos investigados hoje foi apresentado no ano passado na
conferência internacional da organização, realizada em Copenhague
(Dinamarca). Dois estudos mostraram que a perda acentuada da capacidade
de sentir odores está significativamente associada à progressão da
doença. Isso porque a deficiência pode, nesse caso, ser um indicativo da
morte de células cerebrais que fazem o papel de reconhecimento
olfativo.
A associação foi feita por pesquisadores da Faculdade
de Saúde Pública de Harvard, que investigaram 215 pacientes idosos
aparentemente saudáveis. Essas pessoas, contudo, já apresentavam
pequenos problemas de perda da habilidade e, nos exames laboratoriais,
verificou-se que tinham depósito de beta-amiloide. Os pesquisadores
também mediram o tamanho de duas importantes estruturas existentes nos
lobos temporais.
De fato, eles descobriram que os indivíduos com
maiores níveis de proteína amiloide no cérebro são aqueles com menor
capacidade de identificação de odores e pior desempenho nos testes
cognitivos e de memória. De acordo com John H. Growdon, um dos autores
do estudo, o exame, por ora, poderá ajudar a identificar candidatos em
potencial para as pesquisas clínicas de Alzheimer. “É um resultado
promissor, mas temos que nos aprofundar mais nos estudos para saber como
o teste olfativo poderá ser utilizado nos consultórios para a detecção
inicial da doença”, diz.
FONTE: Paloma Oliveto - Correio Brasilienze
Publicação:26/01/2015
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